Campanha publicitária do MOB pretende mobilizar e engajar a sociedade sobre o assunto

(Por Ingrid Vogl)

Você já foi privado de algo porque julgaram que você seria incapaz de fazer ou entender? É com essa reflexão que a terceira fase da campanha Reveja Seus Conceitos, do programa Mobilização para Autonomia (MOB), da Fundação FEAC, vai para as ruas e para os ambientes digitais a partir deste mês.

Com uma mensagem provocativa e que pretende levar reflexão e conscientização para a sociedade, as peças da campanha privam as pessoas de informações, com frases como “isso não é para você”, ou “ achamos que você não entenderia…” Criada pela Agência Sala, a iniciativa vem mais instigante e madura em sua terceira fase, como definem os profissionais responsáveis pelo conceito criativo das peças.

Fábio Wanderley, sócio da Sala, considera o terceiro ciclo da campanha do MOB como uma evolução de discurso. Segundo ele, a campanha começou de uma forma incisiva, porém sutil, trazendo mensagens que deixavam as pessoas curiosas sobre o que estava sendo dito. Foram usados, por exemplo, outdoors em libras que intrigaram as pessoas.

“Assim criamos o primeiro contato com o público, trazendo essa mensagem sobre inclusão. Na segunda  fase, a gente trabalhou dando voz às pessoas com deficiência: elas abordaram questões sobre as dificuldades que passam, que são as mesmas de qualquer pessoa, tentando passar um pouco essa barreira de que pessoas com  deficiência não estão aptas a fazer algumas coisas, quando na verdade é muito mais um prejulgamento da sociedade como um todo do que de fato o que acontece na vida deles. E agora chegamos nessa terceira fase em que mais uma vez a gente tenta provocar. Com a maturidade que temos no discurso com o MOB e a FEAC, a gente pode ousar um pouco mais, e a ideia dessa  vez é que a gente consiga incomodar um pouco para que elas entendam que muitas vezes as pessoas com deficiência se incomodam com as reações e preconceitos que outros têm”, explicou Fábio.

Vinícius Gandolphi, redator da campanha, frisou que muitas coisas não chegam às pessoas com deficiência, como lazer, arte, empregos, porque existe o pensamento de que aquilo não é para elas. “A campanha inverte isso, dizendo que o filme, ou a vaga de emprego não é para ela.  Ou seja: eu vou te excluir como você me excluiu. Justamente porque queremos com isso despertar nas pessoas essa reflexão. Está faltando a gente tocar nesse assunto e despertar a sociedade para essa realidade”, disse.

Segundo Fábio, quando uma mensagem é retirada porque se acredita que ela não é para você, é como grande parte das pessoas lida com a pessoa com deficiência: elas presumem que a pessoa não tem capacidade de exercer determinada função, que não pode assistir a um filme ou aprender a tocar um instrumento.  Na realidade, ela não se dá ao trabalho de pensar se existe alguma forma dessa pessoa com deficiência consumir esse tipo de entretenimento ou realizar determinada tarefa. “A campanha vem para levar reflexão para que se abra mais a cabeça para permitir algumas coisas ou se aventurar a tentar conhecer alguém diferente, dar a oportunidade de trabalho, para que ocorra uma conscientização e uma inclusão maior”, explicou.

Pesquisa

Para a criação, desenvolvimento e maturidade da campanha Reveja Seus Conceitos, houve muita pesquisa. Foi feito contato e bate papo com pessoas com deficiência para saber delas quais são os anseios, o que falta e o que é confortável para elas. Quando se sentem bem, quando elas sentem distinção e quando não há diferença. “Foi muito importante a gente entender e se aproximar da realidade delas para absorver as impressões e percepções.  Muito do que a gente trouxe da campanha foi um discurso latente entre as pessoas com deficiência: de que muitas vezes o que falta é a questão da igualdade, sem distinções”, contou Fábio.

Para Fábio, a sociedade tem um preconceito hereditário, que é enraizado ao longo das gerações.  Hoje a gente tem um movimento geral no mundo de tentar incluir. As pessoas estão mudando o mindset e por isso é um momento muito oportuno para fazer essa campanha. E é justamente isso que as pessoas com deficiência querem: ser tratadas como pessoas que são, em situações mais igualitárias, e não com um discurso de superação”, explicou.

Segundo Vinícius, o contato com as pessoas com deficiência foi fundamental para a criação da campanha. “Ouvimos, entendemos e colocamos o coração naquilo que fomos escutando. E isso acabou fazendo com que fossemos os primeiros impactados pela nossa campanha. Olhar para dentro da gente e pensar quantas vezes a gente não excluiu uma pessoa com deficiência, e como podemos agir diferente a partir de agora, é uma experiência realmente transformadora. Fazemos uma revisão dos conceitos e podemos falar para mais gente: vamos pensar diferente”, analisou Vinícius.

A partir daí, foram criadas peças que fazem um convite para que as pessoas revejam seus conceitos. Elas estarão em cinemas, outdoors, mídias digitais, rádio, TV e outros meios de comunicação. Nenhuma peça será assinada, mas todas direcionarão para o site www.revejaseusconceitos.org.br  , onde há depoimentos de pessoas que participam da iniciativa, informações sobre a ação e sobre o MOB. Os vídeos foram produzidos pela Lokomotiv. 

A veiculação nos diversos meios de comunicação só foi possível  porque as mídias gentilmente cederam espaços para as peças publicitárias. As empresas de comunicação parceiras da campanha são: Campinas.com.br; Emprega Campinas; EPTV; Grupo Bandeirantes (rádios e TV); Jornal Correio Popular; Pró Visão Outdoor; Rádio Brasil Campinas; Rádio Educativa; Rádio Globo CBN Campinas; Simmedia/Cinemark; TV Câmara Campinas.

 Mudança de paradigmas

Se a campanha Reveja seus conceitos pretende levar a sociedade a pensar diferente sobre as pessoas com deficiência, ela também leva seus participantes a uma transformação pessoal. Que o diga Lucas Silva Lopes, estudante de Direito da PUC Campinas que participa da iniciativa desde 2018 e pela sua experiência, se ligou de que o principal problema é a desinformação da população. “Com essa campanha comecei a fazer uma análise mais crítica e refletir sobre o meu cotidiano, sobre coisas que eu acabo naturalizando, sobre que tipo de pessoa sou e o que quero, a partir das restrições que as pessoas julgam que tenho”, disse.

“O conceito da campanha é muito bacana, porque ela parte do princípio de quebrar todos os estereótipos. Me marcou a oportunidade que a iniciativa deu para as pessoas com deficiência falarem sobre a capacidade que possuem. Pudemos falar sobre nossas impressões, o que seria mais interessante ressaltar na campanha. Fiquei feliz porque percebi a possibilidade de representatividade real, e não aquela que a mídia geralmente traz, vinculando a deficiência a incapacidade ou a figura de alguém incompleto. Porque fazemos coisas que outras pessoas pré julgam que não somos capazes de fazer, e isso acaba restringindo o direito das pessoas com deficiência. E falar sobre isso foi importante, porque esse preconceito acontece muito no nosso dia a dia”, explicou.

Outro ponto ressaltado por Lucas é a pluralidade e individualidade com que a campanha trata as pessoas com deficiência.  A iniciativa pauta a igualdade garantindo o respeito à diversidade. “Não somos um grupo homogêneo e não temos todos as mesmas necessidades. Por isso se quer saber é preciso perguntar, e não fazer deduções que possam levar a estereótipos ou equívocos. As deficiências são diferentes, mas os preconceitos são iguais. Seguem a mesma estrutura e o mesmo raciocínio”, disse.

E pautar, mobilizar e engajar a sociedade sobre o assunto já vem dando resultados. Desde que Lucas começou a acompanhar e participar da campanha, ele já percebeu engajamento e mobilização da comunidade com a qual convive. “Percebo que esse é o primeiro passo para uma conscientização maior. O MOB, por meio da campanha, faz um movimento de ir até os locais e debater o assunto. Na minha faculdade surtiu efeito, porque depois que o MOB levantou o debate sobre pessoas com deficiência, professores e alunos ficaram interessados. Inclusive em disciplinas que tratam de direitos humanos, as pessoas com deficiência foram integradas. A gente está no início do processo de diálogo, e está sendo muito positivo, porque percebi que talvez o primeiro passo seja deixar que as pessoas ouçam a minha história para descobrirem que não há uma única narrativa sobre deficiência, e que cada um tem potencialidades que podem ser desenvolvidas”, disse.

Regiane Fayan, líder do programa Mobilização para Autonomia, ressalta que um dos objetivos estratégicos do MOB é mobilizar a sociedade para o tema. “Estima-se que cerca de 24% da população brasileira tenha deficiência, segundo o Censo de 2010. E essas pessoas estão estudando? Estão trabalhando? As vemos nas ruas? E quando há convivência, como são tratadas? A campanha, iniciada em 2017, começou com a ideia de dar visibilidade, no ano seguinte trouxemos o tema “Todos somos diferentes” para não enaltecer apenas que o outro é diferente por ter alguma limitação física, sensorial, intelectual ou mental e neste ano viemos com o tema “Todos temos direitos”, justamente para mostrar que o problema não está na pessoa que tem uma limitação, e sim nas barreiras existentes na sociedade”, analisou.

A campanha Reveja seus conceitos é um projeto do Programa Mobilização para Autonomia (MOB), iniciativa da Fundação FEAC que investe em soluções com o objetivo de assegurar a inclusão efetiva das pessoas com deficiência. Se dedica a romper barreiras para que as pessoas com deficiência possam participar da sociedade e exercer plenamente seus direitos.

Reveja seus conceitos e saiba mais: www.revejaseusconceitos.org.br