(Por Ingrid Vogl)

Quartos amplos, sala, cozinha e banheiro organizados em um ambiente arejado. As quatro casas que acolhem cerca de 50 crianças e adolescentes de 0 a 17 anos e 11 meses no Lar da Criança Feliz têm a proposta de reproduzir, o mais próximo possível, um ambiente domiciliar e de cuidados para os acolhidos que estão afastados do convívio familiar por meio de medida protetiva (art. 101 ECA).

Os prédios construídos por meio de doações de diversas empresas, acolhem meninas e meninos. O maior e mais recente deles, com 219,40 m², recebeu recursos financeiros da Fundação FEAC. A obra toda custou R$ 450 mil, sendo que a FEAC investiu R$ 150 mil.

Com quatro suítes, uma brinquedoteca e todas as demais áreas que compõe uma casa, o prédio segue as normas previstas na legislação que possui as orientações técnicas para os serviços de acolhimento. A necessidade de construir um prédio adequado surgiu em 2012, quando todos os critérios previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e nas Orientações Técnicas para Serviços de Acolhimento de Crianças e adolescentes, precisariam ser atendidos pelos abrigos.

A partir disso, arquitetos, engenheiros, empresas e a própria FEAC se uniram para viabilizar a execução do projeto. Uma das exigências era de que o prédio deveria comportar no máximo 20 crianças. Questões como acessibilidade e privacidade também foram alguns dos critérios a serem seguidos. “Por meio da FEAC, o projeto foi aprimorado e isso levou o prédio a ficar mais iluminado”, lembrou o presidente da instituição, Ademar de Campos.

“Este prédio foi feito por pessoas que abraçaram a missão. Buscamos fazer o mais próximo possível do que seria o ideal preconizado por lei e conseguimos fazer exatamente como deveria ser. Tivemos o envolvimento de empresas e instituições como a FEAC, além da orientação da Vigilância Sanitária, Prefeitura e Vara da Infância e Juventude”, afirmou Ademar de Campos.

Resultados

Após a construção do prédio maior, os demais também passaram por reformas para adequações. As novas instalações começaram a ser utilizadas em 2013, e os resultados de um novo ambiente adequado às necessidades dos acolhidos foram imediatos.

Para Viviane Nale, gerente do Departamento de Arquitetura da FEAC, a infraestrutura pode influenciar no dia a dia dos acolhidos. “O bom espaço expressa sentimentos e estímulos. Importante observar que os espaços podem ser percebidos de formas diferentes por cada indivíduo, dependendo da bagagem do observador, mas sem dúvida quando construído com o desenvolvimento de programa especifico para sua utilização, o mesmo passa a ser o protagonista impulsionador do conforto e bem-estar”, explicou.

Segundo Josane Rossi Lazaretti, coordenadora técnica do Lar da Criança Feliz, o ambiente influencia no conforto das crianças. Um lar confortável, bonito e limpo, é essencial para integrar o trabalho da equipe, que não é simplesmente oferecer comida, abrigo e cuidados. Aliado a isso, também está o trabalho de motivação de vida e os valores desses acolhidos.

“A organização de uma casa é fundamental para se trabalhar a saúde mental de crianças e adolescentes. É preciso que haja rotina, organização e regras para que eles tenham referências e assim se tornem autônomos, tenham o sentimento de pertencimento e de valorização do que é deles. Isso faz parte do desenvolvimento e inclusive, muitos deles levam para as famílias o que aprendem aqui”, avaliou Josane.

A.L.C.J, 17 anos, é o acolhido que há mais tempo está na instituição, há cinco anos. Ele concorda que um ambiente agradável é essencial inclusive nas relações interpessoais dentro do abrigo. “Para mim, um lugar bonito e limpo facilita muito a convivência com as pessoas. Acho até que os funcionários nos auxiliam com mais facilidade neste ambiente organizado. É um espaço bacana e melhor do que em outros lugares que estive. Aqui é um bom lugar para eu reestruturar minha vida e seguir em frente”, concluiu.

Abrigo

Atualmente com 47 crianças e adolescentes, em sua maioria vítimas de maus tratos e que estão em situação de alta vulnerabilidade, o Lar da Criança Feliz tem como principal objetivo tentar reinserir os acolhidos em suas famílias de origem. Josane explica que isso não acontece necessariamente para os pais, mas pode ocorrer para avós ou tios. “A grande maioria das crianças volta para suas famílias. Pela lei, elas devem ficar no abrigo por no máximo dois anos, mas em alguns casos, devido a recursos judiciais ou demora no processo de adoção, esse tempo pode se estender por anos”, explicou a coordenadora técnica.

Para Josane, um dos grandes desafios do trabalho são os transtornos mentais que os acolhidos apresentam. “ O perfil das crianças e adolescentes que recebemos está mudando. Isso porque muitas mães são dependentes químicas, de álcool ou apresentam transtorno mental, e as crianças acabam apresentando quadros similares. Hoje, de 50 acolhidos, 20 tomam remédios psiquiátricos”, revelou.

Outra necessidade dos abrigos é a formação de profissionais para lidarem com a realidade das crianças e adolescentes atendidos. “Há uma rotatividade muito grande de profissionais nesta área, o que causa descontinuidade em um trabalho que exige o estreitamento de vínculos com as famílias e os acolhidos. Portanto, é fundamental investir na valorização e qualificação desses profissionais”, disse.

Em um trabalho complexo e desafiador, Josane lembra que a rede de atendimento social deve trabalhar integrada com o mesmo objetivo: o bem-estar da criança e do adolescente. “É preciso que todos os segmentos: instituições, poder público e família entendam que têm responsabilidades para que este tipo de trabalho aconteça com qualidade”, concluiu.

Saiba mais sobre o Lar da Criança Feliz: www.larcriancafeliz.org.br