Projeto Território de Todos oferece atendimento domiciliar na região Sudoeste de Campinas.

(Por Ariany Ferraz)

Entender as barreiras vivenciadas na cidade e criar possibilidades de superação. Essa é a proposta do projeto Território de Todos, que busca atender em domicílio pessoas com deficiência intelectual ou síndrome de down e suas famílias na região Sudoeste de Campinas.

A iniciativa integra o Programa Mobilização para Autonomia (MOB) da Fundação FEAC. A missão da inédita proposta é proporcionar saúde emocional, proteção social e inclusão ao inserir essas pessoas em serviços, contextos e espaços relacionados às demandas sociais. Partindo da compreensão de que a participação ativa da pessoa com deficiência no seu entorno e na vida comunitária integram a inclusão social e podem reduzir e romper muitas das barreiras existentes, o projeto trabalha o pertencimento e promove a inclusão territorial.

O projeto está sediado no Centro Comunitário do Jardim Santa Lúcia (CCJSL) que já atende a população que reside na área ao norte da região do Ouro Verde, Chácara Campos Elíseos, Jardim Santa Lúcia, Vila União, Parque Tropical e Jardim Novo Campos Elíseos. De acordo com Fernanda Baccan, assistente social no projeto, a região foi selecionada justamente porque apresenta alto índice de vulnerabilidade social e falta de equipamentos para atender a população com deficiência intelectual.

A região foi identificada por meio do “Diagnóstico Socioterritorial da população assistida pela Fundação Síndrome de Down”, que mapeou os locais utilizados pelas pessoas com deficiência intelectual e Síndrome de Down, desde espaços de lazer, cultura, esportes, educação, saúde e assistência social. Parceira da  Fundação FEAC, a Fundação Síndrome de Down é quem executa o projeto e traz sua expertise de atuação para atender o público por meio de diversas metodologias. A equipe da Fundação FEAC também contribuiu com a identificação da região graças a dados censitários que indicam grande concentração de pessoas com deficiência e alta vulnerabilidade social na localidade.

“Esse mapeamento trouxe um resultado, tanto em forma de dados quantitativos quanto de fluxos, de onde as pessoas saem, para onde elas vão e do uso que as pessoas fazem da cidade. E a gente notou que uma parcela das pessoas com deficiência intelectual fica restrita muito na residência ou no seio da família e sem muitos amigos fora do círculo familiar. Foi daí que surgiu a proposta de um projeto em que uma equipe vá até a residência das pessoas e promova aos poucos a inclusão no território em que ela vive”, explicou Marina Moreto, coordenadora técnica do projeto.

“O projeto Território de Todos foi inspirado em um dos serviços previstos na política de assistência social. Enquanto projeto piloto propusemos o recorte na pessoa com deficiência intelectual, devido às barreiras atitudinais muito presentes para este público. Propor soluções para que possamos alcançar uma sociedade para todos é a proposta do MOB”, revelou Regiane Fayan, líder do Programa MOB da Fundação FEAC.

“A Fundação Síndrome de Down acredita que pode proporcionar melhorias em seu próprio trabalho através das articulações com a rede intersetorial entendendo que a inclusão acontece quando a pessoa participa ativamente de sua comunidade, ou seja, quando diminuem ou desaparecem as barreiras para sua circulação e uso em seu território dos serviços locais de saúde, educação, lazer, cultura, assistência social, mobilidade, etc”, avaliou Ana Ligia Agostinho, responsável pela Comunicação da Fundação Síndrome de Down.

Impactos significativos e inclusão

Com uma equipe composta de cinco educadores sociais, um psicólogo, uma assistente social e uma coordenadora, o Território de Todos traz pela primeira vez para a cidade uma experiência única. “Esse é um projeto inovador, de ter um atendimento em domicílio, de pensar o território da pessoa junto com a família e por não ter limite de idade”, apontou Fernanda Baccan, assistente social.

A equipe explica que o projeto atende  uma demanda latente com oportunidades para a pessoa com deficiência e para cuidadores. “A gente percebeu que as pessoas sentem falta de algo assim, pois geralmente os cuidadores estão muito sobrecarregados e passam boa parte do tempo dedicados às pessoas cuidadas. Esse serviço é uma possibilidade de crescimento para a família, de autonomia para a pessoa assistida e de uma forma diferente e mais qualificada de viver”, esclareceu André Padoveze, psicólogo.      

O fato de muitas pessoas com deficiência encontrarem diversas barreiras reduz a frequência de atividades, aumentando a permanência em casa. “É muito bom para as pessoas que estão afastadas do convívio social. As pessoas com deficiência intelectual em sua maioria evadem da escola e ficam bem reclusas ao espaço da família. Quando a gente chega elas estão eufóricas e ansiosas por poder ampliar essas relações, conhecer pessoas e criar vínculos”, avaliou Janaina Moraes, educadora social. 

O interesse é comum em todas as famílias e pessoas atendidas, avalia o time. Além disso, na maioria da vezes as famílias desconhecem seu território, sua praça e  atividades que acontecem no espaços. “Então, o educador social faz essa mediação entre o usuário, a família, território e equipe técnica que acompanha a dinâmica familiar”, revelou Fernanda.

O primeiro passo é criar vínculos e estabelecer confiança a partir da escuta. “É uma relação tanto com o usuário, quanto com a família, porque ela acaba superprotegendo, o que impossibilita a criação de autonomia”, conta Janaína. “E essa inclusão tem um espectro largo para a pessoa com deficiência. É tanto voltar à escola, frequentar uma oficina artística, ou passar a frequentar a praça do bairro ou andar de ônibus sozinha”, esclarece Marina.

A equipe de educadores realiza uma série de visitas com atividade lúdicas e pedagógicas com os usuários, coletando informações sobre o que a pessoa gosta de fazer, sua história de vida, depois agenda passeios e visitas a diversos locais, além de realizar também encaminhamentos para os serviços próximos no próprio território. “A ideia é que aos poucos a pessoa se sinta confiante e segura para ir por conta própria frequentar os espaços da cidade”, afirma Marina.

“Da primeira experiência em atendimento com um jovem adulto já estamos colhendo bons resultados. Ele já começou a sair de casa e está interessado no mercado de trabalho. Está tendo uma outra perspectiva de vida”, conta Fernanda Baccan.

As pessoas atendidas chegam por meio de encaminhamentos da rede socioassistencial, como Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), Centros de saúde, hospitais e serviços de saúde, de educação, programas de mercado de trabalho, entre outros. Apresentações do projeto nas escolas também estão previstas a fim de gerar novas demandas.

Romper barreiras

Neste processo estão sendo encontradas diversas barreiras. Uma dificuldade muito comum é relacionada à educação, quando por exemplo, muitas pessoas com deficiência não conseguem completar o ensino médio, ou mesmo quando finalizado têm dificuldade de ler e escrever. Sem contar a dificuldade do convívio na escola, por preconceitos e não aceitação. A Coordenadora do projeto aponta que a estrutura da sociedade que é concretizada na cidade é excludente, desde “questões simples como tomar o ônibus quanto a capacitação dos professores dentro da escola, o entendimento de uma fila de espera no centro e saúde”.

“A partir do momento que a gente entende que o acesso à cidade pelas pessoas está sendo prejudicado por falta de políticas públicas e que para conseguir fortalecer e qualificar a condição de vida das pessoas é necessário sair da nossa zona de conforto a gente decide alcançar as pessoas dentro das suas próprias casas”, indicou André Padoveze, psicólogo.

E por conta desses fatores limitantes, a proposta também é conseguir capacitar serviços e pessoas. André explica que as pessoas com deficiência não precisam ser atendidas em lugares específicos. “A ideia é sair disso, da educação especial, por exemplo. São trabalhos direcionados, mas também caracterizam uma segregação. A ideia é a gente conseguir criar circunstâncias de capacitar espaços e famílias para assegurar que as pessoas com deficiência estejam na escola, nos serviços de convivência, de todos, não específicos. São as duas coisas, serviços  e pessoas aptas a darem condições de acolhida para todos”, concluiu.

Sobre o Programa MOB

O Programa Mobilização para Autonomia (MOB) é uma iniciativa da Fundação FEAC que investe em soluções com o objetivo de assegurar a inclusão efetiva das pessoas com deficiência. Se dedica a romper barreiras para que as pessoas com deficiência possam participar da sociedade e exercer plenamente seus direitos.