(Por Laura Gonçalves Sucena)

Quando a música começa, ninguém consegue ficar parado. Assim são as tardes das segundas-feiras no Centro Cultural Louis Braille de Campinas durante as aulas de dança de salão, que promovem a autoestima, a superação de limites, a integração e a comunicação intergeracional, além de momentos de lazer.

Na instituição parceira da Fundação FEAC, mais do que aprimorar os movimentos, a dança permite à pessoa com deficiência visual construir suas próprias ideias de tempo e espaço e de manutenção do equilíbrio pela reorganização postural a partir da utilização dos outros sentidos. Desta forma, estabelecem o próprio ritmo de aprendizagem por meio da experimentação, do contato corporal, do toque, da exploração do espaço e dos sons.

Para o professor de dança da instituição Ailton Emídio os conhecimentos adquiridos nas aulas são levados para as atividades da vida diária.  “Para o cego, a dança possibilita a superação de limites impostos pela deficiência, ampliando as possibilidades motoras com a execução de movimentos conscientes. Ela promove a melhoria do equilíbrio e da locomoção, da socialização, da realização pessoal e propicia uma vida ativa. Além disso, a dança aumenta a compreensão da noção de tempo e espaço e de consciência corporal”, explicou.

O professor, que também é deficiente visual, trabalha em dois salões de dança como freelance, ou seja, como contratado para dançar com quem está sem par. A experiência nos bailes o levou a dar aulas. “Vim dar aula como voluntário pelo amor que tenho pela instituição. Com isso acabei aprendendo que a atividade é tão boa para os alunos como é para mim. É um prazer e um aprendizado diário”, relatou.

De acordo com Emídio, a dança ainda proporciona a autonomia. “Hoje as pessoas com deficiência visual estão em todos os salões de dança de Campinas. Começamos há 8 anos com um projeto de levar os alunos para os salões e eles gostaram muito”, falou.

Nos salões de Campinas, a familiaridade com o ambiente é total. “Eles vão aos bailes semanalmente e não querem saber de ficar em casa. Têm autonomia e autoestima, coisas que a dança proporciona. Do mesmo modo, o pessoal que frequenta esses espaços já é familiarizado com os deficientes visuais e eles são tratados de igual para igual, sem nenhuma discriminação social”, falou o professor.

No espaço de convivência das aulas de dança, os alunos buscam o desenvolvimento de suas potencialidades. O objetivo é integrar as pessoas, proporcionar um local de convívio e relacionamento e promover a qualidade de vida.

Para a assessora social do Departamento de Assistência Social (DAS) da Fundação FEAC, Natália Valente, desenvolver estratégias para que algumas barreiras sejam rompidas deve ser o objetivo principal dos trabalhos realizados juntos às pessoas com deficiência, buscando proporcionar assim a efetiva inclusão na sociedade.

De acordo com o presidente da instituição, Benedito João Bertola, as aulas favorecem trocas interpessoais e contribuem para o bem-estar de todos. “Há uma interação plena entre os participantes, valorizando as trocas e experiências.  As gerações se mesclam e existe uma comunicação entre todos. Percebemos que existe prazer, curiosidade e o respeito das potencialidades de cada um”, afirma.

Com 15 anos de existência, a oficina faz o maior sucesso entre os usuários da entidade. “Temos um espaço de convivência fantástico que promove a autoestima, a socialização e ainda traz ganhos para a saúde. Também garante a convivência intergeracional entre os usuários e isso favorece a troca de experiências. Aqui somos todos amigos e isso nos torna uma grande família”, garantiu o presidente.

Adeus depressão

Ao perderem a visão, muitas pessoas entram em depressão, como aconteceu com dona Tereza Daniel, de 74 anos, que frequenta as aulas de dança desde 2004. “Comecei a perder a visão quando tinha 45 anos e fiquei muito chateada e depressiva. Não queria acreditar no que estava acontecendo, mas com a passar do tempo descobri o Braille e a dança, que me ajudou muito”, exclamou.

“A visão, dentre os sentidos humanos, talvez seja o que admite maior riqueza de detalhes, pois é responsável por cerca de 80% das informações que são captadas do meio externo. Ao longo da vida, as pessoas enfrentam perdas e a qualquer momento, com maior ou menor dificuldade, passam a compreender que isso é condição inerente à vida. No caso da perda da visão, o luto faz parte da adaptação e da forma como a pessoa redescobrirá a maneira de  lidar com esta nova situação e continuar a viver com independência. Isso dependerá muito do apoio externo, de um ambiente sem barreiras, e dos demais sentidos aguçados”, explicou Regiane Fayan, assessora técnica do DAS, dedicada ao Programa Mobilização para a Autonomia (MOB).

Dona Tereza, antes de perder a visão, desfilava na escola de samba Nenê da Vila Matilde, de São Paulo/SP. “É difícil aceitar que está perdendo a visão. Mas quando conheci o professor e voltei a dançar minha vida mudou. Hoje eu até durmo ouvindo música e quando toca algum som que gosto muito me levanto e ensaio alguns passos. Também vou ao salão de vez em quando para me divertir”, contou.

A dança de salão traz benefícios físicos e emocionais às pessoas com deficiência e ajuda a superar problemas. Segundo o professor Emídio, as aulas proporcionam aos usuários um ganho em termos de referência, espaço e agilidade corporal. “Mas, mais importante é a alegria que a atividade traz”, resumiu.

Maria Amparo Lago dos Reis, diz que a dança mudou sua vida “Sempre gostei de dançar, mas não tinha a oportunidade. Perdia a visão em 2012 e em 2013 vim para a instituição. No começo deu uma depressão, mas a dança mandou ela embora. Que depressão que nada, eu quero mais é dançar e ser feliz. Vou ao baile toda semana e me divirto muito”, finalizou.

Saiba mais: www.facebook.com/pages/Centro-Cultural-Louis-Braille